Dec 14, 2007

jeitinho russo

durante a guerra fria os soviéticos sempre arranjaram algum jeitinho para fazer com que os seus companheiros tivessem, ou ao menos achassem que tinham, aqueles mesmos bens que as pessoas do ocidente capitalista adoravam ostentar.

o exemplo mais visível disso é o Lada Riva. além de ser um dos carros mais poluentes que o mundo já teve notícia, ele parecia ter sido desenhado por um criança na quarta série do primário com pressa no fim da aula. foi essa gambiarra de baixíssimo custo que permitiu que boa parte da URSS dirigisse sobre quatro rodas. tardiamente, o carro chegou no Brasil de Collor atendendo pelo simpático nome canino de Laika. sua baixa qualidade não impediu que ele se tornasse um objeto de culto ao redor do mundo. não à toa, foi o segundo carro mais vendido da história, perdendo somente para os besouros alemães.

muito além da indústria automobilística, os russos transcenderam sua embromação no que se refere à fotografia.

um dos exemplos disso são as câmeras LOMO. mesmo com todos os flickrs e câmeras digitais por aí, ela tomou o mundo e agora tem um culto quase equivalente ao das câmeras leica, que são as melhores da história.

a indústria lomo surgiu em 1914 para servir aos propósitos da I Guerra Mundial, fazendo lentes e armamentos. é ela própria que produz a primeira câmera fotográfica russa em 1930, somente décadas depois da terra do Tio Sam.

não pense que por ter surgido muito muitos anos depois do Sr. Kodak popularizar a fotografia nos EUA que a máquina lomo deveria ter uma qualidade que faça jus ao seu tempo. é a lomo quem prova o conceito, as vezes pouco palpável, de que fotografia não é a realidade. suas fotos são altamente contrastadas, distorcidas e confusas. mas, é claro, gozam de um charme invejável!

seu "ápice" se deu no começo da década de 80 quando a já tradicional indústria Lomo, sediada em São Petersburgo, recebeu ordens do general russo Igor Petrowitsch para produzir uma cópia da câmera japonesa Cosina CX2. a idéia era de que todos os russos tivessem essa cópia, batizada de Lomo LC-A, em casa. a imitação, é claro, não foi tão fiel assim. o que sobrou da ordem militar foram fotos incríveis como essa:

a Rússia achou que podia popularizar a fotografia com uma câmera barata e vagabunda. já os comunistas tchecos acharam uma solução ainda mais criativa para sua falta de verba: encartar uma câmera de papel em meio a uma revista estatal.

como assim? assim: em 1979, eles publicaram na revista ABC mladých techniků a přírodovědců uma folha de alta gramatura que, se dobrada e cortada corretamente nas linhas pontilhadas, podia ser transformada em uma incrível câmera pinhole. mais que no sputnik ou que nas olimpíadas do ursinho, foi na câmera de papel tcheca que o comunismo teve seu ápice, mostrando o que realmente significa dar oportunidade igual a todas pessoas de forma ridiculamente barata.

enquanto isso, na década de 90 brasileira, as nossas revistas ainda encartavam, com os mesmos pontilhadinhos, coisas como dados ou enfeites de natal. convenhamos de que nada adianta o terno branco e o chapéu de palha: em termos de malandragem, os soviéticos nos deixam no chinelo.